Eu nunca soube escolher as palavras certas para falar com você, por mais que fosse nítida a quantidade absurda de vezes em que você me exigia que falasse, ainda que se resumisse a algumas palavras. Eis que o colégio pede para que nós escrevamos cartas para nossos respectivos pais e eu parei para pensar em cada pessoinha que não tem uma figura paterna para escrever-lhe. Ou mesmo para quem tem, mas que não tivesse essa liberdade ou facilidade em escrever. Eu sou uma delas.
Nunca fui de falar muito, pai. Não em casa. Com meus amigos até que eu falo, é fato. Às vezes até demais, talvez para suprir todo aquele tempo calada. Nunca fui de conversar muito com você nem com mamãe, mas assim mesmo, ainda tinha uma conversa ou outra com ela. E por mais complicada que fosse, ela sempre se esforçou para entender - e não conseguia algumas vezes, ficava frustrada e me frustrava também... Mas tentava. Você não. Você apenas se aborrece. Diz que eu vivo em um mundo só meu e que, quando finalmente perceber, será tarde demais para querer aproveitar sua presença aqui.
Mas, pai, você não pôde ver que eu aproveito assim, no meu silêncio, observando tudo. Você não conseguiu ver que eu prefiro não falar e não magoar você. Sempre que me cobras isso, eu lembro de você doente. Eu lembro de como eu não fazia ideia de como reagir diante daquilo, da minha impotência; queria ligar, mostrar que me preocupava... E ao mesmo tempo não queria atrapalhar, nem sabia direito o que falar. Eu nem lembro da última vez que te disse que te amo. 
Só que não quer dizer que eu não amo, pai. Não quer dizer que eu não me preocupo com você e nem que eu seja desleixada com a sua vida. Eu só tenho um jeito diferente de fazer as coisas e eu sei que você não concorda com essa maneira, mas é a única que eu sei ser. E não pense que não sou grata por tudo o que já fez e faz por mim. Eu sei que, da sua maneira, você também faz tudo o que pode, tudo o que considera ser o suficiente. E eu entendo isso. Jamais cobraria mais de você, porque eu entendo a sua cabeça - por mais que não concorde com muitas coisas -, eu respeito suas questões e pontos de vista e eu acredito que tudo somente seja uma questão de aceitar o espaço um do outro.
Pai é quem ouve, quem conforta, quem ama, quem cria, quem ensina com o erro e mostra que errar não é o fim do mundo; é só o início dele. Eu não sei muito sobre isso, considerando meus exemplos e o fato de ainda não ser mãe. Mas eu pretendo ser. E pretendo me sair muito bem nisso. Pelo menos o seu lado extrovertido disso tudo eu pretendo levar até meus filhos.
Eu não vou mudar por você, nem você por mim. Então vamos apenas seguir em frente como sempre foi antes de querer de fato nos conhecermos. Já sabemos o suficiente. Eu sou calada, você falante. Eu sou universo, você uma só estrela. Eu tenho sonhos que você só consegue ver o lado ruim e eu não concordo com metade de suas atitudes e ideais, mas tudo bem. Ainda és meu pai. Ainda és ocupante de um dos lugares mais importantes do meu potente coração. Obrigada por tudo e apesar de tudo. Feliz dia dos pais.

P.S.: Eu sei que o dia foi domingo, mas eu só consegui pôr pra fora agora. Você esperou mais de uma década para vir tentar uma aproximação. De alguma forma, acho que estou um pouquinho no débito, não?


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